[Exclusivo] Prisões de predadores sexuais pela PF aumentam quase 37% em 2024

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O número de prisões expedidas pela Polícia Federal (PF) contra abusadores online aumentou 36,9% em 2024, de acordo com dados cedidos a pedido do TecMundo. O levantamento leva em consideração o período de janeiro a outubro dos dois períodos.

Nos dez primeiros meses de 2023 foram expedidos 73 mandados de prisões preventivas e temporárias. No Código Penal, a prisão temporária é de cinco dias (prorrogáveis por mais cinco dias) e serve para que o suspeito não atrapalhe a investigação policial. Já a prisão preventiva não tem prazo e tem como um dos objetivos proteger a sociedade.

No ano passado, o estado com o maior número de detenções por crimes cibernéticos relacionados ao abuso sexual infantojuvenil foi o Ceará, com 12 prisões.

CSAMO armazenamento, distribuição e produção de material infantil estão dentre os principais crimes relacionados a abusos online contra crianças e adolescentes. (Imagem: YakobchukOlena/Getty Images)

Bahia e Amapá (7) estiveram empatados na segunda colocação dentre as unidades federativas com mais pessoas detidas, seguidos do Rio de Janeiro (5).

Confira, abaixo, o número mês a mês e por estado de prisões preventivas e temporárias da PF, em 2023, em relação a crimes cibernéticos relacionados ao abuso sexual infantojuvenil:

  • Janeiro: Maranhão (2 prisões); Ceará (4); Pará (1); Paraná (2); Rio de Janeiro (2); Rondônia (1); Tocantins (1);
  • Fevereiro: Amazonas (1); Amapá (1); Paraíba (1); Pernambuco (1); Rio de Janeiro (2);
  • Março: Alagoas (1); Bahia (1); Mato Grosso do Sul (1); Pernambuco (1); Rondônia (2); Tocantins (1);
  • Abril: Bahia (4); Distrito Federal (1); Rondônia (1); Rio Grande do Sul (2);
  • Maio: Amazonas (1); Amapá (6); Mato Grosso do Sul (1); Paraíba (1); Pernambuco (1); Rio de Janeiro (1); São Paulo (1);
  • Junho: Mato Grosso do Sul (1); Roraima (2); São Paulo (1);
  • Julho: Amazonas (1); Bahia (1); Ceará (1); Distrito Federal (1); Minas Gerais (1); Mato Grosso do Sul (1); Pará (1); Pernambuco (1);
  • Agosto: Bahia (1); Ceará (7); Distrito Federal (2); Maranhão (1); Paraíba (2); Rio Grande do Sul (1); Sergipe (1);
  • Setembro: Ceará (1); Distrito Federal (1); Mato Grosso do Sul (1);
  • Outubro: Acre (1); Ceará (1); Distrito Federal (2); Paraíba (1); Sergipe (1).

Aumentos dos crimes em 2024

Segundo os dados da PF, em 2024 foram realizadas 748 operações para combater crimes cibernéticos relacionados ao abuso sexual infantojuvenil (CSAM). Neste montante de operações, a Polícia Federal resgatou 53 vítimas.

Já em relação às prisões, neste ano o número de temporárias e preventivas expedidas entre janeiro e outubro foi de 100, o que representa o aumento de quase 37% na comparação com o mesmo período de 2023.

Levando em consideração o balanço preliminar da PF, o estado de São Paulo liderou o infame quesito de prisões contra abusadores sexuais. Ao todo, foram 16 pessoas detidas. Não só prisões, SP também lidera no quesito de operações, já que foram 145 até outubro.

CSAMEm 2024, o Brasil teve operações como a "Lobo Mau" para prender supostos abusadores. (Imagem: Getty Images)

Confira, a seguir, o número de prisões temporárias e preventivas expedidas entre janeiro e outubro de 2024 por estado em relação a crimes cibernéticos relacionados ao abuso sexual infantojuvenil. Os estados fora da lista não tiveram registros de detenções no período:

  • Acre: 4;
  • Alagoas: 2;
  • Amazonas: 3;
  • Bahia: 4;
  • Ceará: 5;
  • Distrito Federal: 2;
  • Espírito Santo: 1;
  • Goiás: 1;
  • Maranhão: 2;
  • Minas Gerais: 1;
  • Mato Grosso do Sul: 2;
  • Mato Grosso: 1;
  • Pará: 9;
  • Paraíba: 13;
  • Pernambuco: 5;
  • Piauí: 1;
  • Paraná: 7;
  • Rio de Janeiro: 8;
  • Rondônia: 3;
  • Roraima: 7;
  • Rio Grande do Sul: 3;
  • São Paulo: 16.

Investigações complexas

Em entrevista ao TecMundo, Hericson Santos, que é perito da Polícia Civil de São Paulo, explica um pouco sobre a dinâmica das operações contra os predadores sexuais. Primeiro, ele pontua que a nomenclatura “pedófilo” não é mais utilizada e que oficialmente eles descrevem quem comete estes tipos de crime de “abusador”.

Santos afirma que atualmente as polícias brasileiras têm boas tecnologias para lidar com este tipo de situação e parte da dificuldade no combate a estas questões vêm de situações logísticas.

“Hoje em dia temos uma metodologia muito bem estabelecida, então a dificuldade maior acaba sendo operacional. Por serem crimes digitais, é preciso falar com várias agências nacionais e internacionais. É desafiador manter contato e braços em vários locais do Brasil e do mundo”, comenta.

CSAMOs efeitos de abusos sexuais contra crianças e adolescentes perduram a vida toda das vítimas. (Imagem: Getty Images)

Outra situação relembrada por Hericson toca na complicação que envolve o gerenciamento de materiais com abuso infantil por outros agentes de segurança. Ele cita que alguns colegas acabam “não tendo estômago” para isso, já que muitas imagens e vídeos capturados pelos policiais são extremamente fortes.

“Trabalhar diariamente com isso não é fácil, além do que não temos necessariamente um preparo específico para lidar com tudo isto. Nos Estados Unidos, por exemplo, eles chegam a fazer uma pausa e passam por uma análise para verificar se poderão continuar combatendo este tipo de crime”.

O perito afirma que já soube até mesmo de casos de policiais passando mal e pior. “Tive conhecimento de pessoas que começaram a fazer o uso de material após ter contato pela primeira vez no trabalho”, revela.

Canais de divulgação dos crimes

Agora, Hericson Santos comenta que o Telegram passou a ser um dos principais canais de disseminação destes materiais de abuso sexual infantojuvenil.

“Antes o problema era o WhatsApp, mas a Meta se comprometeu com uma política de reportar às autoridades a disseminação deste material. Neste sentido, as big techs têm ajudado muito”, comenta.

No caso do Telegram, pelo menos desde 2021, o app vem sendo acusado de contribuir pouco com o combate não só ao abuso sexual digital, mas também ao trafico de drogas, de seres humanos e outros crimes.

TelegramO Telegram pretender ser um ambiente de liberdade de expressão, mas com isso, a plataforma acaba disseminando conteúdos criminosos. (Imagem: Leon Neal/Getty Images)

Depois de muita pressão e até mesmo da prisão do criador do mensageiro, o Telegram começou a contribuir com a Justiça e se comprometeu até mesmo a monitorar e remover fotos e vídeos de abuso infantil.

“O Telegram tem começado a contribuir mais, mas sempre foi uma terra sem lei. Neste sentido, o Signal também tem sido muito utilizado [para compartilhar materiais de abuso]. E como os abusadores sempre vão buscando alternativa, toda hora surge um aplicativo novo e a gente precisa começar a investigar”, argumenta o perito.

Comentando sobre o modus operandi dos abusadores, o perito explica que os antigos criminosos que atraiam crianças nas ruas com balas, pirulitos, brinquedos e etc são minoria atualmente.

CSAMOs abusadores sempre encontram novas formas de compartilhar CSAM. (Imagem: urbazon/Getty Images)

O profissional diz que na era da digitalização, todo o grooming (que significa aliciamento de menores) é feito por meio de redes sociais. Muitos abusadores, inclusive, nem chegam a ter contato físico com as vítimas.

“Hoje a grande maioria do conteúdo de abuso infantojuvenil não foi o adulto que fez,  foi a própria criança que gravou. Os abusadores abordam as vítimas prometendo skins ou armaduras em jogos, seguidores em redes sociais ou dinheiro, se envolvem sentimentalmente e depois pedem para que elas tirem fotos de si mesmas ou gravem conteúdos sexuais”, conta.

“Muitas vezes o abusador mora em outro estado ou outro país. Com o material em mãos, ele vende para outras pessoas na internet”, acrescenta o perito.

A prisão não é o suficiente

Complementando os dados divulgados pela PF, Hericson Santos pontua que desde 2016 já foram presos no Brasil cerca de 1,8 mil pessoas que cometeram crimes de divulgação de CSAM (material de abuso sexual infantil, em português). Além disso, cerca de 180 crianças foram resgatadas nestes 8 anos.

Palestrante, divulgador de pesquisas e materiais de conscientização sobre crimes digitais e autor de treinamento para policiais, promotores e outros profissionais no Brasil e América Latina, Santos também integra a Child Rescue Coalition (CRC), ONG que luta para identificar e prender abusadores.

O perito defende que a atuação policial é essencial para manter a repressão. Contudo, ele faz questão de ressaltar que a repressão não é o suficiente para lidar com o aumento destes crimes que são cometidos por meio de telas de celulares, computadores, tablets e etc.

CSAMAlém das prisões e operações contra os criminosos, é essencial gerar o debate e educar. (Imagem: spukkato/Getty Images)

“No Brasil, sempre tivemos um foco repressivo. Se prende muito por aqui. Mas a grande questão é que precisamos educar digitalmente para que as crianças não produzam estes conteúdos também. Elas precisam ter conhecimento de que não podem se relacionar na internet sem saber quem está do outro lado da tela”, defende.

Santos lembra ainda que a família também é indispensável nesse processo. Ele afirma que o acompanhamento das mães, pais e responsáveis sobre tudo o que menores de idade consomem na internet pode ser o diferencial para que crianças e adolescentes não sejam vítimas dos abusadores.

“Hoje em dia, deixar a criança no quarto não é mais um bom método de castigo igual antigamente. Nos quartos elas têm celulares, computadores, videogames. Sem supervisão, o acesso à internet nestes dispositivos acaba sendo um campo fértil para os criminosos”, finaliza.

CSAMA educação contra possíveis casos de abuso deve ser realizada na família, escolas, igrejas e todos os outros grupos sociais. (Imagem: Inside Creative House/Getty)

Realidade Violada 3

Além desta reportagem, o assunto de abuso infantil na internet também é o tema do terceiro episódio do Realidade Violada, websérie documental do TecMundo que revela os bastidores dos cibercrimes no Brasil.

Chamado de Realidade Violada 3: Predadores Sexuais, o novo episódio traz relatos exclusivos de agentes de segurança e hackers que lidam diretamente com esses crimes de bastante complexidade.

“A linguagem será diferente, por conta da complexidade do tema, mas o formato do Realidade Violada já foi encontrado. Nosso objetivo é que possamos jogar luz em um tema sensível e revelar as melhores proteções sobre ele”, afirma Felipe Payão, editor de cibersegurança do TecMundo e autor do documentário.

Nesta terça-feira (09), Realidade Violada 3: Predadores Sexuais teve sua primeira exibição pública no Cinemark do Shopping Eldorado, em São Paulo (SP). A versão para o público será divulgada em 14 de dezembro, próximo sábado, no YouTube do TecMundo.

Confira, abaixo, o trailer de Realidade Violada 3: Predadores Sexuais:

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